PERFIL DE LIDERANÇA PARA TREINADORES DE FUTEBOL NA VISÃO DE TREINADORES... (Continuassem)
Os resultados apresentados na Tabela 1 mostram uma tendência dos treinadores a perceber que o estilo de decisão autocrático é o mais adequado ao comando de equipes de futebol. Essa afirmação é fundamentada na freqüência de respostas dos entrevistados nas opções “freqüentemente” e “sempre” da dimensão “comportamento autocrático e também na freqüência de respostas das opções da dimensão “comportamento democrático, uma vez que se trata de dimensões antagônicas de comportamento. Além disso, os resultados obtidos na análise de variância dessas dimensões mostram que o estilo autocrático é estatisticamente diferente do estilo democrático (p=0,006). Isto quer dizer que os entrevistados, de fato, consideram que a liderança autocrática é mais eficiente que a liderança democrática na condução de uma equipe de futebol.
O fato de a opção ocasionalmente da dimensão comportamento democrático ter apresentado a maior frequência de respostas dessa dimensão mostra certo equilíbrio dos treinadores no exercício do estilo de decisão, que, de acordo com a literatura, pode ser modificado de acordo com a situação vivenciada (ANDREW, 2004; CHELLADURAI ; SALEH, 1980; CHELLADURAI, 1993; COSTA, 2006; LOPES, 2006, SERPA, 1990). As situações que os entrevistados desse estudo consideram as mais importantes no exercício da liderança democrática estão relacionadas às reuniões da equipe, às aprovações dos atletas em assuntos importantes, à valorização das ideias dos atletas mesmo quando são diferentes das do treinador e a participação dos atletas durante os treinamentos. Essas respostas também mostram que o tratamento de respeito entre treinador e os seus atletas é um aspecto importante para a construção de um ambiente agradável para exercício da liderança sobre o grupo.
Em relação aos estilos de interação do treinador observa-se na Tabela 1 que a freqüência de respostas na opção “sempre” da dimensão “comportamento de treino-instrução” foi superior às outras dimensões que compõem os estilos de interação do treinador. Apesar de essa dimensão não possuir um alto valor de alfa de Cronbach, afirma-se que parece haver uma tendência dos treinadores a achar que o modelo de profissional é aquele mais voltado para os aspectos técnicos e táticos da sua equipe durante as competições e as sessões de treinamento.
Outro fato que também mostra a importância da dimensão “comportamento de treino-instrução” no comportamento de liderança dos treinadores é o baixo índice de respostas com as opções “nunca” e “raramente”. Ainda de acordo com os dados apresentados na Tabela 1, verifica-se que os treinadores também consideram que os aspectos das dimensões de “comportamento de reforço positivo”, “comportamento de consideração situacional” e de “comportamento de suporte social” são importantes no convívio diário com os seus atletas. De acordo com Mccann, Langford e Rawlings (2006) e Schmidt e Wrisberg (2001), os benefícios advindos destes aspectos podem atenuar, principalmente do ponto de vista motivacional, a rigidez do estilo de liderança voltado para a dimensão “comportamento de treino-instrução”.
Em relação às dimensões que compõem o estilo de interação, a análise de variância mostrou que a dimensão “comportamento de treino-instrução é estatisticamente diferente (p=0,000) das demais dimensões que compõem esse estilo, podendo-se afirmar que existe uma preferência por essa dimensão dentro do perfil de liderança para treinadores de futebol.
Por meio do teste de comparações múltiplas de DUNCAN também foi possível verificar que as médias obtidas nas dimensões “comportamento de suporte social” e de “comportamento de treino-instrução” se diferenciam estatisticamente (p=0,002) das outras médias apresentadas e que entre as médias das dimensões “comportamento de consideração situacional” e “comportamento de reforço positivo” não existem diferenças estatísticas (p=0,056).
Tabela 1 - Freqüência de resposta dos treinadores em todas as dimensões da ELRE
Dimensões De Comportamento Da Elre
Opções de respostas | Autocrática | Democrática | Treino instrução | Reforço Positivo | Consideração Situacional | Suporte Social | ||||||
| n | % | n | % | n | % | n | % | n | % | n | % |
Nunca | 24 | 15,00 | 31 | 12,92 | 1 | 0,5 | 3 | 1,25 | 4 | 2,00 | 13 | 8,13 |
Raramente | 27 | 16,88 | 59 | 24,58 | 1 | 0,5 | 8 | 3,33 | 10 | 5,00 | 17 | 10,63 |
Ocasionalmente | 25 | 15,63 | 80 | 33,33 | 5 | 2,5 | 22 | 9,17 | 29 | 14,50 | 32 | 20,00 |
Frequentemente | 35 | 21,88 | 47 | 19,58 | 55 | 27,5 | 95 | 39,58 | 61 | 30,50 | 29 | 18,13 |
Sempre | 49 | 30,63 | 23 | 9,58 | 138 | 69,0 | 112 | 46,67 | 96 | 48,00 | 69 | 43,13 |
Total | 160 | 160 | 240 | 160 | 200 | 100 | 240 | 100 | 200 | 100 | 160 | 100 |
DISCUSSÃO
Dois fatores que dificultam a discussão dos dados desse perfil de liderança são a existência de poucas pesquisas que investigaram essa versão do ponto de vista dos treinadores e o fato de as pesquisas que utilizaram as ELREs serem muito recentes e escassas. Por causa disso e para enriquecer a discussão dos resultados encontrados serão citadas outras pesquisas que estudaram a liderança no esporte utilizando a LSS e/ou que tiveram a amostra composta por atletas.
Ao avaliar o estilo de decisão dos treinadores, os entrevistados mostram certa tendência pelo estilo autocrático, ao invés do democrático. Esses resultados encontrados nessas duas dimensões corroboram alguns resultados dos estudos de Chelladurai e Carron (1983) e Beam, Serwatka e Wilson (2004), que tiveram atletas como amostra. Tais estudos mostraram que os atletas do sexo masculino preferiam o estilo de liderança autocrático.
Também os resultados desta pesquisa corroboram o estudo de Costa e Samulski (2006), que foi realizado nos mesmos moldes deste estudo e com treinadores de equipes de futebol profissional que disputaram o Campeonato Mineiro/2005. Os resultados encontrados nesse estudo foram semelhantes, indicando que os treinadores pesquisados por Costa e Samulski (2006) também têm preferência por um estilo autocrático de liderança.
Não obstante, os dados encontrados nesta pesquisa contradizem outros estudos realizados (CHELLADURAI, 1984; TERRY, 1984; CHELLADURAI ; ARNOTT, 1985; SCHLIESMAN, 1987; SERPA, 1990; RIEMER; TOON, 2001; SUMOSKI, 2002; COSTA, 2003; ANDREW, 2004; OLIVEIRA; VOSER ; HERNANDEZ, 2004; VANFRAECHEM, 2005; LOPES, 2006). Destes, somente o de Costa (2003) verificou a importância do estilo de decisão no perfil de liderança do ponto de vista dos treinadores. Os outros estudos foram realizados levando em consideração a visão dos atletas sobre um perfil de liderança para treinadores. Em relação à divergência dos resultados de pesquisas sob a ótica do atleta e do ponto de vista do treinador, Costa (2003) afirma que pesquisas dessa natureza, que envolvem a percepção dos atletas sobre o estilo de liderança do treinador, conduzem a resultados de pesquisas concisos, porém divergentes quando comparados à autopercepção do treinador.
Em relação ao estilo de interação, observou se que os resultados desta pesquisa indicam que os entrevistados consideram, em ordem de prioridade quanto à importância para o perfil de liderança do treinador de futebol, as dimensões “comportamento de treino-instrução”, seguidas das dimensões de “comportamento de reforço positivo”, “comportamento de consideração situacional” e “comportamento de suporte social”. Antes de apresentar a discussão dos resultados que condizem com esse estilo é importante lembrar que a dimensão “comportamento de consideração situacional” encontra-se somente na ELRE. Como nesta discussão se mencionam outros estudos que utilizaram a LSS, será feita uma ressalva em relação a essa dimensão.
Os resultados deste estudo mostram a dimensão “comportamento de treino-instrução” como a mais importante para o perfil detreinador, na concepção dos entrevistados. Esses resultados corroboram os resultados de outros estudos encontrados na literatura(CHELLADURAI; SALEH, 1978; TERRY;HOWE, 1984; TERRY, 1984; RIEMER; TOON,2001; SHERMAN; FULLER; SPEED, 2000;OLIVEIRA; VOSER; HERNANDEZ, 2004;LOPES, 2006; COSTA; SAMULSKI, 2006).
Alguns desses estudos citados foram realizados com atletas e os seus resultados mostraram a preferência por um determinado comportamento de liderança do treinador que também valoriza a dimensão “comportamento de reforço positivo (CHELADURAI ; SALEH, 1978; RIEMER; TOON, 2001; SERPA, 1990; SHERMAN; FULLER ; SPEED, 2000; TERRY ; HOWE, 1984; TERRY, 1984; OLIVEIRA; VOSER; HERNANDEZ, 2004; LOPES, 2006).
Nesses estudos, os índices de respostas na dimensão “comportamento de reforço positivo” ficaram entre os dois mais altos dos estilos de interação, o que ocorre também neste estudo. O estudo de Lopes (2002) também verificou a importância dessas duas dimensões, porém com a ordem invertida, primeiro “comportamento de reforço positivo”, depois “comportamento de treino instrução”.
Quanto à dimensão “comportamento de consideração situacional”, foi encontradas apenas quatro pesquisas com nas quais foi possível inter relacionar os resultados encontrados. Embora este estudo tenha apresentado a dimensão “comportamento de consideração situacional” como a segunda dimensão com menor importância, a tese de doutorado de Andrew (2004), que avaliou essa dimensão entre tenistas, verificou que a dimensão “comportamento de consideração situacional foi a mais importante. O trabalho de Beam, Serwatka e Wilson (2004) mostrou que as atletas possuem grande preferência por esse estilo de interação do treinador. Os estudos de Lopes (2006) e Costa e Samulski (2006) também apresentaram resultados em que essa dimensão foi considerada a segunda mais importante, na visão dos atletas. Tendo como referência esses quatro estudos citados, percebe-se que somente neste estudo a dimensão “comportamento de consideração situacional” foi avaliada como a penúltima dentro do estilo de interação de liderança dos treinadores.
Observa-se também que a dimensão “comportamento de suporte social” foi a que apresentou o menor valor na preferência do estilo de interação por parte dos entrevistados, sendo que resultados semelhantes também foram encontrados em outros estudos (RIEMER; TOON, 2001; COSTA, 2003; SERPA; PATACO; SANTOS, 1991; SHERMAN; FULLER; SPEED, 2000; LOPES, 2006; COSTA; SAMULSKI, 2006).
CONCLUSÃO
Os resultados obtidos neste estudo mostram que o perfil de liderança para um treinador baseia-se no estilo de decisão que seja autocrático e voltado para o desenvolvimento dos aspectos técnicos e táticos da sua equipe durante as competições e as sessões de treinamento. Além disso, verificou-se que o estilo de decisão do treinador pode ser modificado de acordo com a situação vivenciada e que o estilo de interação do treinador com os atletas também deve abranger os aspectos das dimensões “comportamento de consideração situacional”, “comportamento de reforço positivo” e “comportamento de suporte social como uma forma de atenuar, principalmente do ponto de vista motivacional, a rigidez do estilo de liderança voltado para a dimensão “comportamento de treino-instrução”.
Para futuras pesquisas na área da liderança no futebol sugere-se a realização de pesquisas interculturais que envolvam a participação dos treinadores que atuam no Campeonato Brasileiro Série A e treinadores que atuam nos principais campeonatos de seus países, com o intuito de conhecer quais as principais diferenças entre os perfis de comando desses profissionais, além de pesquisas que objetivem comparar a autopercepção de “novice-coaches” e “expertcoaches” em relação aos seus perfis de liderança e de estudos que também objetivem analisar a liderança do treinador de futebol na visão dos atletas, tanto para o perfil real quanto para o perfil desejado, com o objetivo de averiguar a satisfação dos atletas quanto ao estilo de comando dos treinadores e a congruência das percepções destes profissionais
LEADERSHIP PROFILE TO SOCCER COACHES ACCORDING TO TOP BRAZILIAN COACHES
ABSTRACT
This study aimed to identify the factors derived from the leadership style of soccer coaches in the Brazilian National Championship/2005. It was used a questionnaire to characterize the sample and the Revised Leadership Scale for Sport, ideal profile version, as instruments for data collection. Twenty top-level soccer coaches of the Brazilian National Championship participated of the research. They presented an average age of 50 years (±6.92) and a direct involvement with soccer coaching of 15.10 years (±8.42). The internal consistency of the leadership scale was a=0.86. The results showed that the coaches interviewed consider autocracy and training-instruction aspects as the main components of the profile leadership.
Data also showed that the situational, positive feedbacks and social support aspects are important in the process of leadership. To sum up, it is possible to conclude that leadership profile to soccer coaches combines autocratic decision style and the technical, tactical and motivational performance of the team.
Keywords: Leadership. Coach. Soccer.
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Endereço para correspondência: Israel Teoldo da Costa. Laboratório de Psicologia do Esporte-LAPES, Centro de Excelência Esportiva-CENESP, Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional-EEFFTO, Universidade Federal de Minas Gerais-UFMG. Av. Presidente Antônio Carlos, 6627, Pampulha, CEP 31310-250, Belo Horizonte-MG, Brasil. E-mail: israelteoldo@gmail.com
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